quinta-feira, 11 de março de 2010

Ainda tenho medo


Ainda tenho medo da socialização globalizada nos deixar mais frios. É notável a insistência do ser-humano em permanecer solitário durante a pouca vida que lhe resta. Algo como sentar no banco de um ônibus qualquer, sozinho, mais perto da janela mas longe de outras pessoas. Tenho medo de um dia ter um carro e esse veículo me tirar da poesia da vida. Todo dia vejo muita coisa interessante dentro do ônibus, dentro de um carro que passa na rua e daqueles que, desconhecidos, tornam-se por alguns segundos, amigos itinerantes, quando reclamam do governo, puxam assuntos rápidos e dizem que você parece com o neto ou o filho dela. Tudo muito feliz quando você dá abertura para que essas conversas aconteçam, mas não retiro algumas queixas sobre o transporte, mas isso é para o outro post.
Disso me lembro das cartas (tenho uma crônica sobre isso) que antes eu escrevia e tinha todo o trabalho de ir ao correio e mandar à avó que mora no interior, sem contar a escolha do papel, da cor da caneta e outras firulas menores e bem importantes. Uma vez, por um descuido, sujei o papel com chocolate em pó, quando compunha uma carta mais elaborada e aproveitei para deixar o descuido introduzir-se entre as letras. O pó foi junto e lá caiu sobre o colo da tia. Ela riu ao contar e um pouco do meu dia aqui, foi para lá. Hoje, muitos dos meus parentes de lá não tem e-mail, até hoje. Não dá para mandar chocolate em pó pela internet.
O papel passava por várias mãos, chegava até lá. O mesmo papel que eu escrevi e pouco amassei, foi o papel que foi para lá, que também pegaram e amassaram um pouco mais ao ler, rir e guardar novamente no envelope rasgado ao lado.
Dou muito valor, também, às fotos e condeno um pouco a massiva quantidade delas em redes sociais de outrem. Fotos são momentos vivos estáticos. Todo mundo chora, ri e percebe o clima daquele flash e a importância que a imagem tem para si. Escolho bem quem sai comigo nas fotos e espero que me escolham também. A beleza cai bem na foto, mas a verdade também se reflete nela.
Tenho muitas – fotos – mas poucas escolho para o mural, seja ele digital ou aquele azul do meu quarto, mas elas estão guardadas e algumas delas, já estão tortas, velhas no mural, mas não consigo tirá-las de lá.
Ainda tenho mesmo o medo de ser frio com tanto trabalho, tanta rotina e tanta digitalização. Tudo em três, quatro, cinco dimensões mas cada vez mais frio, mais longe e as pessoas rodam como em uma roleta.
Tenho muitos conhecidos e pessoas especiais. Amigos, sinceramente poucos, inclusive minha mãe (a maior delas, beijo mãe!) mas trago fotos e momentos comigo de pessoas que eu verdadeiramente passei momentos bons. Na foto no início do texto, intitulada por mim “O Segredo” ensaiávamos como reagir efusivamente a um segredo e nela, está retratado um pouco do que eram tardes rotineiras de trabalho, porém tardes de risadas. Nada de friacas!

Um comentário:

  1. Poxa, que saudades desse tempo. Seu texto me fez refletir. Certamente em tempos globalizados temos muita informação, infovias, redes sociais, mas muitas vezes nos sentimos sozinhos. Sinto muita falta de sua companhia pelas aquelas tardes agradabilíssimas. Torço por vc. Abraços e sucesso!

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