terça-feira, 5 de outubro de 2010

Imagem é tudo. O cinegrafista, nada.

Para responder rápido (e refletir):

1. "Diretor de Titanic"?
2. "Câmera (cinegrafista) que fez a imagem de Rose e Jack furunfando no calhambeque?"
3. "Apresentador do Altas Horas"?
4. "Câmera que foca o entrevistado quando ele entra pela direita do palco"?


Putz, assim como a palavra 'cinegrafista', até as perguntas são complexas.


Por essa sua cara azeda ao pensar no nome dos fulanos das perguntas 2 e 4 que escrevi este texto.


Imagem é tudo. O cinegrafista, nada. Já parou para pensar que por trás de tudo que vemos na TV tem uma pessoa? Parece idiota, mas há certo sentido imaginar o autor da imagem gravada por trás da tela da televisão. Quase sempre esquecemos que aquelas imagens que entram pelas fechaduras, ultrapassam janelas, saem da boca de leões, foram câmeras que registraram. Tipo: você assiste a uma novela ou a um filme e não imagina que os movimentos, a imagem gravada ali foi feita por um camarada, segurando firme a máquina de gravar, no caso a câmera. E se caso você lembre, não dá muita importância para isso.
Algumas experiências pessoais me confirmam tal fato. Ter uma rotina de gravações com vários temas, vários lugares inclui também gravar várias pessoas e aí se encontra o problema. Para quem não sabe, trabalho com produção audiovisual para dois portais, de grandes veículos de comunicação no Brasil: um deles, o jornal O Estado de S. Paulo (http://tv.estadao.com.br) e o outro, o Portal MSN (http://video.br.msn.com/browse/tvestadao)
Não somos uma emissora de TV e por isso o forte desses veículos são matérias impressas, conteúdo on-line e imagens estáticas. No caso do MSN, há destaque para o serviço de mensagens instantâneas. Embora o vídeo seja um grande e revolucionário passo na construção midiática desses veículos, ainda estamos engatinhando no audiovisual online (mas, não considere que estamos atrasados), porém, quando um vídeo se destaca, grande parte dessa mídia se volta para tal e momentaneamente o audiovisual se torna importante, mas nada supera o impresso, claro, considerando o veículo jornal. Porém, não escrevi esse texto para discutir a importância do vídeo, mas do cinegrafista, no caso: eu. Eu e tantos outros milhares espalhados pelo mundo.
Há créditos para o nome do veículo, para o entrevistado, conteúdo da matéria, diretor, mas para o cinegrafista, o cara que gravou e que conseguiu imagens, entrou na boca do bicho, passou a bala de raspão, para esse não existe.
Breves relatos confirmam isso: Fui gravar o presidente do Banco Central do Brasil, Henrique Meirelles, na sala de seu gabinete na Av. Paulista. Neste dia, eu e mais um companheiro de labuta montamos, iluminamos e preparamos todo o circo. As assessoras (sempre loiras) ofereceram chá, café, água, leite desnatado para os repórteres. Para nós, só depois que acabou, para não falar que esqueceram.
Outro dia, na cobertura das eleições, ao gravar o comentário de Eduardo Suplicy, percebi que ele ficou tão encantado com a repórter que nem sequer notou minha presença, gravando-o em sua frente. Não digo que o motivo foi a repórter, mas o fato de, ele nem sequer notar a câmera preta, luz, microfone e eu. “Essa matéria vai para onde, rádio!?” perguntou. Sim! 'A câmera na verdade é um super gravador que faz com que o ouvinte veja sua imagem através do rádio.' Será que não reconhecem uma câmera?
Outro fato interessante é quando perguntam: “Tá gravando?”
Os méritos pós-publicação vão para o repórter, ou para o apresentador. Atribuem tudo a ele com um único referencial: o “vídeo”. “Parabéns pelo vídeo, fulano!” E esquecem-se do cinegrafista, do editor e de todo trabalho que foi para finalizar o processo e finalmente assistir a produção.
Engraçado também que, quando a pauta é arriscada, como entrar numa jaula com emas ferozes, (para não usar de novo o exemplo dos leões) o medo sempre fica com o repórter. O cinegrafista fica quietinho, não chama a atenção nem das emas.
Essas emas estão por toda a parte. Não percebem o trabalho complexo para fazer um vídeo de qualidade. O que mais irrita são os ‘amadores’ que querem ser profissionais. Não sabem fazer, não sabem gravar e gravam de qualquer jeito, sem enquadramento, luz e eixo. E no final, dizem: “Tá um pouco tremido, mas dá para ver!”
Um cinegrafista jamais assina uma matéria, palpita na pauta ou sugere uma pergunta, mas um jornalista se arrisca nas imagens. Ósseos do ofício que nada, respeitem o moribundo gravador!
Mas, nem tudo são emas: lembro-me quando gravava o candidato à presidência da república, José Serra, aqui no prédio do jornal e ele ao me notar gravando-o dentro do elevador, soltou: “Pode desligar? Não me sinto à vontade...”