Era no quintal de casa, na sala, com fitas VHS. A minha adolescência foi forrada de pop americano, de N’Sync, Aguilera, BSB e Britney Spears, mas com essa última tive um caso de amor.
Apesar dos pesares, sempre gostei das lôras: Xuxa, Eliana, Britney. Era difícil assumir que gostava dela. Na escola sofria o que hoje tacham de bullying, mas gostava mesmo dela e não era por modinha. Era mais forte do que eu.
O primeiro videoclipe, eu vi em pedaços num programa da Xuxa e depois comecei uma verdadeira saga para encontrá-lo na MTV. Ficava acordado até tarde, gravava programas inteiros e nada de passarem o maldito “Baby... one more time”. Passavam o novo clipe, da praia, mas esse eu não queria, embora essa foi a primeira coreografia que eu me meti a aprender, sozinho.
Era estranho, pois até então eu gostava de artistas nacionais (como “É o tchan!”) e dançava nas festinhas de família. E o sinal de estranhamento apitava, nos outros.
Eu tinha quinze anos, não tinha internet, mas tinha a MTV, que era o santo canal que pegava no 32 sintonizado pelo vídeo cassete. Lembro-me de ter aprendido isso na escola que até então eu imaginava que a emetevê era só para quem tinha o luxo das TV’s por assinatura. Ah, tinha um amigo, o Galvano, que compartilhava comigo das aparições de Britney na tevê e no bulliyng supranatural da escola. (Quem mandou gostar de pop!?)
Consegui o clipe, mas metade dele, que eu gravei quando passou no TOP 10 E.U.A, e passava aos finais de semana. Quando vi a apresentadora anunciar o primeiro lugar, tive tempo de pular do sofá, procurar o VHS na pilha de fitas, enfiar no vídeo cassete, encontrar um lugar para gravar, pois tinha outros clipes lá e eu não podia gravar por cima, apertar o REC, que demorava uns infindáveis três segundos para obedecer. O vídeo cassete fazia um barulho, fazia outro da fita rodando e aí aparecia a bolinha vermelha piscando no visor. Gravei da parte que ela sai do corredor da escola e depois dali via essa metade clipe todo dia.
Por telefone, já contava para Galvano que consegui o clipe. Trocávamos longos telefonemas quando ela aparecia ou quando anunciavam que a princesinha iria cortar o cabelo ou gravar um novo clipe. Novo clipe? Meu Deus! Quando o anúncio era esse, tudo tinha um novo sentido na vida. Lembro quando estreou “(You drive me) Crazy” e nós comentávamos coreografia, música remixada para o clipe e cabelo.
Compramos o CD, que tinha uma rosa estampada nele. Tudo parecia ser para o público feminino e/ou para os afeminados. Ou para os dois.
O fato era: Britney já tinha entrado em casa e dançado comigo na sala de casa. Era minha melhor amiga, aquela que eu achava perfeita e ai de quem falasse algo contra.
Os shows que ela apresentava, remixados e com coreografias puta-foda.
Os tempos mudaram.
Eu JAMAIS poderia dizer na escola que gostava de Britney. Tinha gente que me olhava com repulsa quando eu dizia que ela era linda, que eu adorava as músicas e que queria dançar igual. O povo ria. Ri até hoje na verdade.
Além do Galvano, tinha o Lopes, que foi outro dos meus amigos que eu conheci quando toquei “Oops!... I did it again” numa festa de quinze anos e o vi correr pro meio do quintal-pista e perguntar: “Nossa, você gosta?” e nasceu uma amizade que durou anos.
Um dia subindo a rua de casa, ele me disse que conheceu um pessoal de São Paulo que dançava Britney. Um grupo de Guarulhos, longe pácaralho. E todo sábado a gente ia para lá, quando passamos a dançar no grupo oficial de Sampão. Puta meu! Era uma realização dançar só Britney. A gente dançava oops, dançava crazy e fomos sabe onde? Na MTV, dançar num programa que chamava “Em busca da fama”, que tinha o Max Fivelinha e o Levy como apresentandores. Quanta gente, quanta coreografia, quanta bichona.
Dançamos num palco móvel, um grupo de oito pessoas num espaço crítico. Esse programa foi visto por T-O-D-A a escola onde eu estudava. E agora eu tive que enfrentar radicalmente xingamentos verbais entre outros insultos. Eu (tentava) me convencer que aquilo não me atingia e tinha que fazer pose para dizer que estava tudo bem. Não estava. Eu gostava mesmo dela e das músicas dela, mas o povo queria era xingar, tirar sarro, bichinhas enrustidas.
Saí do cover antigo e entrei num grupo de dança profissional, que dançavam todo tipo de pop americano e eu ensinei Britney, ‘Me against the music’. O grupo era mais maduro que o passado, porém fiquei pouco tempo nele. Deu para dançar em eventos, em cima de caminhões, em showmícios, no Porteira dos Pampas, mas percebi que era eu quem realmente tinha mudado. Meio Sandy sabe?
Os tempos mudaram, novamente. Britney começou uma série de escândalos raspando a cabeça, tendo filhos e sendo vista sem calcinha. Confesso que isso não me afetou, porém eu já com meus vinte e poucos comecei me interessar por Norah, Yael, Corinne, sem forçar. Aos poucos fui esquecendo Britney.
Hoje, suas músicas não têm o mesmo impacto no meu set-list, embora eu ainda ouça as nostálgicas no meu quarto.
Britney também mudou. Hoje não dança mais como antes e como sempre aceitei seus playbacks, dançando era o que importava.
Percebo que hoje ela é uma artista cansada, do tipo ‘não quero mais ser famosa’ porém para os Galvanos, Pires e Lopes de hoje ela ta linda, canta muito e ahazza no palco. Esses dias comentando com Galvano na rede social, que faz séculos que não o vejo, ele me disse que ia ao show em São Paulo, pois eu ‘tava ligado’ o quanto ela fez parte de sua adolescência. E eu sei mesmo. Isso é o que importa.
Na época do Rock In Rio, eu ouvi a transmissão ao vivo pela Jovem Pan e gravei em fita cassete. Me dava um frio na barriga saber que eu não estava lá. Minha mãe não deixou.
Eu conheço um menino do bairro, que ADORA a Britney e tem seus dezesseis anos. Os amigos dizem que ele sou eu, uma espécie de cria, meu filho. Quando olho para ele, com todo o brilho no olhar por uma artista já meio cansada, percebo que para ele não, ela é a mesma Britney de antes. Ela ta em forma, no auge, linda como sempre. São outros olhos que vêem isso e aí ta o segredo todo.
Fui ao show em São Paulo, claro, mas vi uma loira meio insatisfeita com tudo. Fiz até uma matéria sobre e alguns fãs criticaram e defenderam-a com unhas e purpurina. Lá, no show, vi atrás de mim um menino magrinho, com uma câmera na mão. Chorava e cantava todas, inclusive as de dez anos atrás e meu senso crítico nem ousou condená-lo, pois toda magia que me cercava, o cerca hoje além de outros milhares por aí.
Todos temos que ter um ídolo.
Falando hoje, do jeito que falo sobre Britney Spears, parece que nunca gostei, mas antes de muito fã de quinze hoje, eu fui um fã com mais de vinte e cinco.
É engraçado, falar de Britney, adolescência e de hoje. Tudo muda bastante.
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