domingo, 22 de abril de 2012

Um apóstolo morreu em missão


Fiquei muito triste com a notícia do falecimento do ator Tiago Klimeck, 27, que morreu enforcado durante encenação da Paixão de Cristo em Itapeva.
Participei durante dez anos consecutivos de encenações da paixão, sendo que em três deles fui Jesus Cristo em minha comunidade no ABC. Pude compartilhar de momentos de irmandade na construção das narrativas da peça com o grupo Forjoc que está em atuação até hoje, trabalhando socialmente com teatro. Porém as apresentações da paixão até hoje são um marco para quem participou e quem assistiu.
A paixão significa muito para os grupos de jovens, pastorais eclesiásticas e sedes cristãs. É o marco da igreja, até maior que o Natal, pois Cristo (re)nasce. Isso para quem segue a religião cristã.
Fora isso, de seguir ou não, foi fazendo a Paixão de Cristo que eu encontrei amigos de verdade trabalhando em prol da arte e descobrindo o teatro, o trabalho e a vivência em comum-unidade. A rua ficava lotada, a notícia corria os bairros e toda paixão era tomada de um espírito único de trabalho conjunto.
Certo ano, tivemos uma experiência fascinante durante a encenação. Uma personagem, coadjuvante, começou a chorar e se emocionar muito durante as cenas. Ela começou a esbravejar, pedindo que soltassem Jesus e suas lágrimas foram o ápice. Palavras doces ecoavam de sua boca em uma revolta curiosa. O elenco se assustou e a platéia toda se emocionou. Vi até o iluminador fora do palco, chorando ao vê-la suplicar para soltar Cristo, que ali estava na pele de um amigo.
Saiu de si e se entregou ao personagem. Ouso dizer que o espírito de unidade nos mostrou o resultado de se trabalhar por uma boa causa.
Hoje, vendo essa triste notícia, imagino a dor que o grupo que ensaiou, apresentou e se viu nesse desfecho trágico está sentindo.
A simbologia da morte de Judas vem pelo arrependimento, pela tristeza em ter traído o mestre. E atuando, encenando esse arrependimento, o ator morreu de verdade e acabou com a vida de tantos outros que estiveram com ele no palco.
Lembrei-me de um amigo, o Everton, que representou Judas em uma das paixões e assustou a todos quando a ‘árvore’ cênica quase rompeu quando ele encenou o enforcamento. Depois, rimos do fato e guardamos com carinho essa lembrança. O grupo de Itapeva não. Vão levar para sempre esse trauma, essa dor que não pode romper a vontade de continuar trabalhando em união.
Tiago, foi um dos apóstolos de Jesus. Na época Tiago, hoje Tiago e ambos morreram em missão.
Fico muito triste quando vejo jovens morrerem, como o menino que morreu após levar um golpe na cabeça na Livraria Cultura, ou a Eloá, morta pelo ex-namorado. Agora, Tiago, apenas um ano mais velho que eu.

Um comentário:

  1. Obrigado por compartilhar conosco a sua reflexão, Daniel, com tanta lucidez, respeito e delicadeza. Deu-nos o que pensar. Um grande abraço! :-)

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