domingo, 7 de novembro de 2010

Coletivo

Viu que faltavam dois para entrar. Não correu e ainda esperou um deles subir. Cansado, depois de um dia inteiro de trabalho, passou a catraca automaticamente, sem perceber e percebeu que não havia lugares para sentar. Apesar de não estar cheio, o coletivo estava com os assentos todos preenchidos e sua cabeça repousou no braço, que antes se pendurou no ferro.
Seus olhos fecharam, seu pensamento não foi muito longe e tudo o que queria era tomar um banho e dormir. Estava com fome, mas o ritmo do dia diminuía conforme o coletivo avançava sobre a cidade.
O carro, este que o deixou na mão, deveria ficar pronto só na semana seguinte e o ônibus grande seria seu meio casa-trabalho durante mais alguns dias. O celular vibrou e ao atender, a ligação caiu. Era a mãe, que deveria perguntar o que queria comer no jantar.
“Qualquer coisa” pensou sem balbuciar e tentou ligar novamente para casa. Desistiu.
Um homem, de baixa estatura, esbarrou em seu sapato. Sapato preto, social, chato. O homem desculpou-se sem encará-lo e ele sem querer percebeu que as unhas do baixinho eram adoentadas, uma bactéria, ou um vírus as tinham deixado pretas. Por um minuto, tentou lembrar a diferença entre bactéria e vírus, mas logo esqueceu a charada e deixou que o homem fosse para perto do cobrador. Era meio velho, tinha entrado pela porta de trás, mas não passava dos cinqüenta e poucos.
Não notou que perto do cobrador, um banco estava vazio e algumas pessoas entravam e logo alguém ocuparia aquele lugar. Quando viu, o coletivo avançou e ele deitou novamente a cabeça no braço.
De longe, semáforos, casas e gente nos bares. Agora, as pessoas já apertavam seu corpo sobre o banco a sua frente. Estava cheio e o calor aumentava.
Novamente o celular. Agora, um amigo. Também desistiu e mandou uma mensagem confirmando um churrasco no domingo. Um resto de alegria o fez sorrir pelo canto da boca. Resolveu ligar para o camarada e ao procurar o nome na lista de telefones, passou pelo nome da sua última namorada. Aline.
Por um minuto, já em outros números, lembrou que, da última vez que seu carro estava com as rodas travadas, voltara nesta mesma linha de coletivo com Aline.
Eram quase sete, horário de verão, ainda tinha sol. Um resto de.
Levantou a cabeça do braço vermelho e arrumou a gola da camisa. O banco perto do homem da unha estava agora ocupado. Uma moça, de traços similares ao de Aline, parecia dormir. Sua cabeça estava muito reclinada a ponto de bater o queixo no peito.
Seu pensamento agora voou e lembrou com doçura de sua ex-namorada. Lembrou de sua boca, de suas mãos quentes e que há um tempo, há pouco tempo, aliás, estavam juntos.
Olhou novamente para a moça sentada, mas apenas viu o cabelo cobrir seu rosto. Pensou novamente ser Aline, mas não. Agora, ela estava somente na agenda de seu celular.

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